Lançado projeto de atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência

        A Coordenadoria da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (CIJ) promoveu hoje (15) o lançamento oficial do projeto Atendimento não revitimizante de crianças e adolescentes vítimas de violência. O evento ocorreu na Associação Paulista de Magistrados (Apamagis) e contou com as presenças dos desembargadores Antonio Carlos Malheiros, responsável pela CIJ, Vladimir Passos de Freitas e Régis de Castilho Barbosa e dos juízes Eduardo Rezende Melo e Richard Paulro Pae Kim, das varas da infância e juventude de São Caetano do Sul e Campinas. 
        O projeto, que tem caráter piloto e obteve financiamento junto à Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministerio da Justiça, contempla quatro varas da infância e juventude do estado – Guarulhos, Campinas, São Caetano do Sul e Atibaia – e também o Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital. Além disso, implementa uma forma de trabalho integrada entre as diversas instâncias de atendimento à criança e adolescente vítimas de violência, o que envolve, além do Poder Judiciário, as secretarias estaduais de Saúde, Segurança Pública e Desenvolvimento Social.   
        O desembargador Antonio Carlos Malheiros, na abertura do evento, afirmou que o Estado como um todo ainda se encontra muito distante da realidade das crianças e adolescentes do país. Contudo, disse estar contente com a tentativa de se caminhar em direção a eles. “Poder para mim significa servir os outros. Nesse sentido, a coordenadoria, instância de poder, vem tentando cumprir o seu papel”, afirmou.  
        O eixo central do projeto é a implantação da escuta especial, procedimento que evita que crianças e adolescentes vítimas de violência (especialmente de violência sexual) tenham que contar sua história repetidas vezes durante o itinerário que percorrem ao serem atendidas, em função da ocorrência, pelos sistemas de saúde, segurança, serviço social e justiça. 
        O juiz Eduardo Rezende Melo contou como tem se dado o atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência nos dias de hoje. Elas chegam a passar por oito instituições diferentes nas quais é solicitado que relatem sua história. Isso gera consequências ruins, pois tal exposição fragiliza a vítima, dando-lhe a sensação de descrédito em relação a sua palavra. Ela pode resolver interromper os relatos e isso levar à absolvição do ofensor. “É essencial repensar a participação da criança de modo que ela se sinta empoderada e participante do processo de justiça,” afirmou o magistrado. 
        Essa diretriz foi dada inicialmente pela Convenção dos Direitos da Criança, tratado internacional que deve ser cumprido no Brasil por ter status de norma constitucional. “Esse é um grande desafio. Trabalhamos com o conceito de proteção da criança, mas ainda estamos agindo como antigamente, considerando a criança como objeto da proteção e não como sujeito ativo. Isso implica o direito de proteção contra o sofrimento no curso do processo,” disse Eduardo Melo. 
        Para implementar a escuta especial no âmbito do Poder Judiciário, a criança deve ser ouvida em um local agradável que não seja a sala de audiências. A ONG Childhood Brasil, que apoia a iniciativa paulista,  chama esse local de 'ambiente amigável'. A ONG é responsável por um projeto que visa a mapear as experiências nacionais de tomada de depoimento especial de crianças e adolescentes em processos judiciais. 
        A vítima será ouvida por um psicólogo, com o apoio, se for necessário, de um assistente social. Foram instalados nos fóruns circuitos fechados de televisão. Nas salas de audiências há uma televisão e na sala onde a criança será ouvida, uma filmadora. As salas contam com equipamentos de áudio e a comunicação entre o profissional que realiza a escuta e os profissionais envolvidos com a condução do processo (juiz, promotor e defensores) é feita por meio de um ramal telefônico. O depoimento é gravado em DVD e só poderá ser assistido pelas partes no fórum, não havendo possibilidade de copiá-lo. Somente em caso de necessidade de prova similar em outro processo é que o DVD é copiado e segue para o processo e não a criança ou adolescente.
        Outra estratégia para minimizar o número de escutas foi a criação de um fluxo interinstitucional de atendimento. Será implementado um documento único de caracterização da violência que deve ser preenchido pela instituição que atender a criança ou adolescente pela primeira vez. As instituições que participam do projeto entenderam que preferencialmente quem deve iniciar o atendimento é o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), por meio do Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (Paefi). Preenchido o documento, ele circula para as outras instituições, que deverão assiná-lo, ao invés de circular a vítima. Assim, o número total de escutas cai para duas: essa primeira escuta e a que se dá no âmbito do Poder Judiciário.
        Outra questão importante foi levantada. A da imprescidibilidade da capacitação para os profissionais que vão atuar com essa nova sistemática. Os que já estão atuando foram treinados durante nove dias na Escola Paulista da Magistratura. O treinamento foi dado pela psicóloga argentina Irene Intebi, presidente da Sociedade Internacional para a Prevenção do Abuso e Negligência de Crianças (Ipscan). A ideia da CIJ é estender a capacitação a todas as equipes do Judiciário e das redes de atendimento à criança e adolescente por meio de videoconferências. 
        Também participaram do evento o secretário de Estado Joge Roberto Pagura (Esporte, Lazer e Juventude); o secretário municipal de Participação e Parceria, Uebe Rezeck; a procuradora de Justiça Aparecida Maria Valadares da Costa Gonçalves (em nome da Associação Paulista do Ministério Público); o promotor de Justiça Lélio Ferraz Siqueira Neto; o deputado estadual Carlos Bezerra; a assesora técnica da saúde da criança Carmela Maggiuzzo Grindler (da Secretaria de Estado da Saúde); a psicóloga Ana Paula Souza Romeo (da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social); as psicólogas do TJSP Dayse Cesar Franco Bernardi, Irene Pires Antonio e Patrícia Vendramim; as assistentes sociais do TJSP Arlete Crivelenti Abrão, Ana Cristina Amaral Moura e Marcia Silva; e o coordenador de programas da Childhood Brasil, Itamar Gonçalves.  
        
        O evento contou com transmissão via internet. Veja aqui: www.apamagis.com.br/videos    

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